segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

anjo negro

Após ter lido o bom "Afirma Pereira" decidi procurar outros livros de Antonio Tabucchi. Encontrei esse "Anjo negro" num garimpo por Porto Alegre, acompanhado pela feliz e quase diáfana Natália (como foi bom aquele dia de aventuras). Bueno. Nos seis contos reunidos neste livro um narrador conta algo sobre uma pessoa (ou cousa, ou situação) essencialmente má ou perversa. Talvez "L'angelo nero" seja em italiano uma metáfora para a depressão (como "Black dogs" o é em inglês). Não sei. São histórias algo fantásticas, inquietantes, onde pouco importa seu desfecho quando comparadas com o clima etéreo e intimista criado para ser o habitat dos personagens inventados por Tabucchi. Em "Vozes trazidas por alguma coisa, impossível dizer o quê" um sujeito ouve frases que pela sincronicidade com seus pensamentos o faz perseguir a idéia louca de que um amigo seu - já morto há muitos anos - o espera no alto de uma torre e lá lhe entregará os segredos de como escrever um livro. Em "Noite, mar ou distância" um grupo de jovens participam de uma tertúlia literária com um escritor mais velho. Ao saírem do lugar são abordados por agentes da polícia secreta (de Salazar, no Portugal de 1969) e passam a ser agredidos, humilhados e ameaçados. Uma das garotas agredidas volta para a casa do sujeito. Em "Boi, boi, boi, boi da cara preta..." uma jovem escritora rouba um livro de um sujeito e ganha alguma fama. Ao ir receber um prêmio literário ela flerta com um velho senhor num trem, uma espécie de anjo vingador. Em "O bater das asas de uma borboleta em Nova York pode provocar um tufão em Pequim?" um sujeito é interrogado por um policial que sabe todos os detalhes de um crime que cometeu há muitos anos. O policial parece mais interessado em fazer com que o sujeito sinta culpa e se arrependa de seu crime do que efetivamente condená-lo. Em "A truta que pula entre as pedras lembra-me da sua vida" um velho escritor devaneia sobre duas mulheres com quem se envolveu quarenta anos antes. Ao ser acordado para o jantar e sair do transe propõe a uma jovem escritora - que é a única pessoa que o visita - entregar-lhe suas poesias inéditas para que sejam publicadas aos poucos, por vários anos após sua morte, como uma forma de manter vivo o interesse do público por sua obra. Na última história (e que Tabucchi afirma numa curta nota ter sido o que restou de um projeto baldado de um romance) um sujeito lembra dos atos algo perversos que pratica em sua infância: caçar de ratos, esconder coisas, roubar a correspondência dos vizinhos, ouvir conversas que a mãe conta aos outros. Lembra também das cartas que escrevia para seu herói infantil, o capitão Nemo, personagem de Júlio Verne, como se essas cartas o mantivessem congelado naquela idade, naquele mundo. Interessante. 
[início: 14/12/2014 - fim: 16/12/2014]
"Anjo negro", Antonio Tabucchi, tradução de Mário Fondelli, Rio de Janeiro: editora Rocco (1a. edição) 1994, brochura 14x21 cm., 145 págs., ISBN: 85-325-0466-3 [edição original: L'angelo nero (Milano: Feltrinelli) 1991]

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