sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

um amor incômodo

Nos meses em que me dedicava a ler a tetralogia napolitana de Elena Ferrante ("A amiga genial", "História do novo sobrenome", "História de quem foge e de quem fica" e "História da menina perdida"), comprei também outros livros dela, mas com os aborrecimentos do ano passado os esqueci em algum canto. Recentemente, no início desse 2018, os reencontrei. "Um amor incômodo" foi o livro de estreia de Ferrante, lançado em 1992 e ganhou imediata boa recepção (somada a curiosidade sobre a identidade sempre velada da autora). Trata-se de uma história muito especial, sofisticada e tocante, ao mesmo tempo cruel, trágica (na medida em que qualquer aventura humana tem sua cota de comédia e tragédia, de alegrias e descontentamentos). Assim como a protagonista da história o leitor acaba por refletir muito sobre si e suas próprias escolhas, conduzido pela trama. Imaginação e memória, velhas irmãs siamesas, parecem se fundir na narrativa. Delia, uma ilustradora de livros infantis de quarenta e poucos anos, conta algo dos desdobramentos da morte de sua mãe, Amália, que afogou-se quando estava em trânsito, com o objetivo de visitá-la (a mãe vivia no sul italiano, Délia em Roma). Ela refaz e tenta descobrir algo sobre os últimos dias da mãe, como se fosse a detetive de um romance policial, mas também se descobre, rememora sua história de família, à medida que uma série de epifanias se acumulam. Cada vez que conto algo da trama do livro para alguém enfatizo um aspecto diferente: ou os momentos que lembram os afloramentos de memória involuntária proustiana, ou os momentos chave da infância e da vida familiar psicologicamente sublimados, ou o registro dos diferentes estados emocionais por meio da linguagem, dos dialetos. Enquanto lia o livro lembrava-me ora em como Ferrante explora a experiência do sonho, similar a de Arthur Schnitzler, ora em como, à exemplo de Proust, naquela cena memorável na biblioteca da Princesa de Guermantes, faz sua protagonista experimentar uma cascata de associações e lembranças, que a intoxicam. Livro muito interessante. Vamos a ver se um dia reencontro a quase vovó Cíntia Pasa e, como fizemos com os volumes da tetralogia, conversamos também sobre esse "Um amor incômodo". Vale! 
Registro #1255 (romance #331)
[início: 03/01/2018 - fim: 04/01/2018]
"Um amor incômodo)", Elena Ferrante, tradução de Marcelo Lino, Rio de Janeiro: Editora Intrínsica, 1a. edição (2017), brochura 14x21 cm., 174 págs., ISBN: 978-85-510-0137-0 [edição original: L'amore molesto (Roma: Edizioni e/o) 1992]

2 comentários:

Anônimo disse...

Menino! Pensei o mesmo sobre o último da tetralogia de Elena Ferrante, corrido demais, tudo dito de forma apressada demais, dava para ter escrito dois livros entre a maturidade e a velhice. Abração.

Anônimo disse...

Eita, comentei aqui nesse livro, mas é que daqui fui até o link do quarto volume, voltei, me confundi, comentei aqui!!